Bem-Vindos

Sejam bem-vindos ao espaço onde através da brincadeira e do conhecimento nos expandimos como seres humanos. O local onde a Família não se resume aos laços de sangue mas essencialmente aos laços do Coração.



Tomás

13 julho, 2010
por Rosa Pires

Atribuíram-lhe o nome de Tomás sem saber ao certo porquê.

Diziam ser o nome de um guerrilheiro Japonês que mais tarde se tinha tornado um conhecido pacificador do seu país. Desde cedo que Tomás prometia ser um gaiato enérgico, não fosse a sua mãe queixar-se dos protótipos de artes marciais que praticava quando ainda no seu ventre.

Mal nascido, revelava já nos seus olhos a doçura dos do seu pai – uma íris bem grande e preta, pestanas longas e expressivas. Da mãe tinha o nariz, pequenino e pontiagudo. As bochechas rosadas davam-lhe ares de saúde e revelavam a harmonia do lar envolvente. A boca raramente se lhe via, pois o apetite voraz colocava-o como ventosa no seio materno. E mal de nós pensar que um ser acabado de se iluminar não possuía a força da vida para sugar o seu próprio alimento...! Por vezes cansava-se e adormecia docemente, quando ainda a sua refeição ia apenas a cinco golos do início.

Tomás era um rapaz diferente. Se pensavam que as suas primeiras palavras iriam ser “Mã” ou “Pá”, enganam-se redondamente. Intenções verbais, tinha muitas. Mesmo sem falar, já fazia sentir as suas exigências e preferências – não gostava de puré de brócolos, pois a maior parte da papa brotava da sua boca, como quem faz balões com pastilha. Mas a surpresa foi no dia em que esboçou um grande sorriso, acompanhado de um grito, enquanto olhava da sua cadeira, para a cadela. “Onda”, disse. Ficámos tontos a olhar o nosso filho. Surpreendidos e sem palavras, pois o diálogo era entre a Onda e o Tomás. Ao que parece, farejando e aproximando-se lentamente, como quem quer passar despercebida, a Onda chega-se à cadeira do Tomás, na expectativa que o alimento caia dos céus, como a chuva. Por vezes tem sorte. Há quem diga que é o destino.

Agarrando a sua colher e vagueando curiosamente pela comida, o Tomás faz arte com os alimentos e por vezes, ou na maior parte das vezes, chega mesmo a maquilhar-se com o que tem à mão. E todo o corpo come e o acompanha nesta divertida exploração – palavras houvesse para descrever a forma como se entusiasma nas horas longas de refeição. Embora goste de provar novos sabores de forma independente, tal como o pai, o que o atrai são as misturas. E então, como druida que compõe a poção mágica, o fiel aspirante a cozinheiro saboreia as suas combinações culinárias e sorri. Ri e abana os braços. De quando em vez, a coordenação falha e em vez da colher se dirigir à boca, faz uma tentativa falhada à testa ou mesmo ao chão. Felicidade é a da Onda, nestas horas de banquetes servidos alguns palmos acima do seu pêlo.

Chegamos a ficar indecisos quanto ao banho… não chegamos a perceber onde começa o Tomás e onde terminam os seus bombardeamentos de comida. No final, ele e o chão têm as mesmas cores. Então, antes que adormeça lambuzado e em tons amarelos e verdes, tentamos não nos enganar e pôr o pequeno na máquina de lavar a roupa e a roupa na banheira. Embora cansado de tanta criatividade, a fonte inesgotável de energia ainda se mantém activa no banho. E são apenas dezoito meses de idade.

Será que vai ser assim?

0 comentários:

Enviar um comentário